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A ministra sumiu

Alguém viu Marina Silva durante a tragédia ambiental do RS?


“Nunca desperdice uma boa crise”, aconselhava Churchill. Pois Marina Silva, a ministra do meio-ambiente, acaba de descartar uma de mega proporções: o desastre climático gaúcho. Alguém a viu ou ouviu nos 30 dias em que o Rio Grande do Sul esteve debaixo d’água? Exceto por uma discreta visita ao estado, com a comitiva de Lula, no início da tragédia, Marina desapareceu do noticiário por completo, cedendo um protagonismo que lhe cabia à midiática primeira-dama, Janja, a colegas de Esplanada e até a presidentes de outros Poderes.


O pecado não está em se eximir dos esforços de reconstrução material do estado, nos quais seu ministério tem pouco a contribuir, ao menos a princípio. E sim em deixar de transformar um episódio aparentemente “natural” naquilo que é em essência: um fato político. Em assumir as rédeas da narrativa e tornar mais visível e palpável a difícil relação de causa e efeito entre mudanças climáticas, decisões governamentais e suas consequências concretas. Hoje, o debate praticamente se restringe ao muro da Mauá e às casas de bomba que não funcionaram, em Porto Alegre, e à construção de moradias na beira de rios, nas cidades do interior. Uma discussão superficial, carente de conteúdo.


Bandeiras não lhe faltariam para alertar que há novos infortúnios contratados Brasil afora. Como ministra, tem de enfrentar os lobbies do agronegócio em busca de menos regulamentação ambiental, orçamento apertado e tentações recorrentes de voltar atrás na incipiente tentativa de descarbonização da economia, com a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas. Um desastre das dimensões vividas pelo Rio Grande seria o momento perfeito para reverter decisões mal encaminhadas, angariar adeptos à causa verde, reivindicar mais verbas para o ministério e emparedar o presidente quanto às suas verdadeiras intenções ambientais. Oportunismo? Talvez. Mas o que é a política senão a ocupação de espaços a cotoveladas?


A inapetência de Marina pelo poder e pelo jogo político não é de hoje. A justa aura de integridade que a reveste deriva daí, inclusive. Seu discurso técnico e ponderado empresta-lhe credibilidade. O problema é que, de técnicos competentes, o ministério está cheio; falta-lhe uma liderança política à altura. Quando pediu demissão do segundo governo Lula, em 2008, contrariada por uma decisão presidencial, Marina disse ser preferível “perder o cargo a perder o juízo”. Não é preciso perder o juízo para ser bem-sucedido num ministério - mas a tibieza, sim.


Artigo originalmente publicado no Diário de Santa Maria, de 18 de junho de 2024.


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